Nova Gorica: a materialização do projeto europeu de livre circulação

A cidade de Nova Gorica, situada no extremo oeste da Eslovênia, na fronteira com a Itália, oferece um estudo de caso singular sobre a transformação das fronteiras na Europa contemporânea. A partir da sua fundação, em 1948, como resposta política e geográfica à redefinição territorial do pós-guerra, Nova Gorica sempre foi marcada por um caráter liminar: próxima, mas separada, de sua “cidade-irmã” italiana, Gorizia.

Com a entrada da Eslovênia na União Europeia em 2004, e especialmente após sua adesão ao Acordo de Schengen em 2007, a fronteira física entre as duas cidades deixou de existir.

O mosaico “Juntos na Europa” representa a antiga fronteira física entre Itália e Eslovênia.

A Praça Transalpina, outrora marcada por arame farpado e fronteiras rígidas, hoje é um espaço onde dois mundos diferentes se encontram e se conversam naturalmente. No território esloveno, encontra-se a estação de Nova Gorica, ponto de partida do trem para Jesenice, cidade a poucos quilômetros da Áustria.

No lado italiano, há uma zona periférica, de ruas serenas e fachadas discretas. Na parte central, Gorizia possui uma forte atmosfera medieval destacada pelo castelo, que já foi cenário de filmes como “Na festa da revolução” e de documentários como “A conquista do Monte Sabotino.”

Castelo de Gorizia

Poucos minutos de caminhada separam duas cidades com atmosferas totalmente distintas, que há menos de de vinte anos atrás eram fisicamente separadas. Hoje em dia, a liberdade de movimento garantida pelo Acordo de Schengen representa a concretização de um princípio central da integração europeia — a livre circulação de pessoas, bens, serviços e capitais.

O mercado interno compreende um espaço sem fronteiras internas no qual a livre circulação das mercadorias, das pessoas, dos serviços e dos capitais é assegurada de acordo com as disposições dos Tratados.” (Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, Artigo 26)

A diversidade cultural das duas cidades ficou para a história. Em 2025, Nova Gorica e Gorizia foram homenageadas com o título de Capital Europeia da Cultura; celebrando não apenas o patrimônio compartilhado, mas também a capacidade de transformar diferenças em diálogo e inovação.

No plano socioeconômico, isso se traduz em:

  • Integração funcional: cidadãos que residem em um lado e trabalham no outro, aproveitando diferenças econômicas e oportunidades complementares.
  • Cooperação institucional: projetos transfronteiriços em áreas como mobilidade urbana, turismo e cultura, muitas vezes financiados por programas da União Europeia.
  • Identidade híbrida: comunidades que transitam entre idiomas, tradições e sistemas, construindo uma realidade multicultural cotidiana.

Do ponto de vista político, Nova Gorica exemplifica o que estudiosos de integração regional chamam de “fronteira líquida” — um espaço onde a delimitação territorial existe juridicamente, mas é permeável e funcionalmente irrelevante para a vida diária. Na União Europeia, esta realidade é comum. Estima-se que 2,1 milhões de pessoas trabalham em um país europeu e residem em outro. Cidades como Estrasburgo (França), Kehl (Alemanha), Basileia (Suíça), Lugano (Suíça) e Luxemburgo reproduzem o fenômeno ítalo-esloveno, onde trabalhadores e famílias atravessam fronteiras diariamente. Essa decisão tende a ser tomada por vários fatores, entre eles diferenças salariais, custo de moradia, qualidade dos serviços públicos e vantagens fiscais. Em Lugano, por exemplo, são muitos os italianos das províncias de Como, Varese e Lecco que atravessam a fronteira atraídos por salários mais elevados e melhores condições de trabalho na Suíça.

Tenho clientes que optaram por morar em um país e trabalhar noutro. Muitas vezes, essa oportunidade é interessante, pois permite aproveitar “o melhor dos dois mundos.” Contudo, mesmo de uma cidade fronteiriça para outra, as práticas sociais, o estilo de trabalho e as normas de relacionamento podem mudar significativamente. Nesse contexto, o coaching transcultural pode ser uma boa ferramenta de apoio ao expatriado: ajuda profissionais a compreenderem essas diferenças, a adaptar sua comunicação e comportamento, e a transformar a diversidade cultural em vantagem estratégica no dia a dia profissional e pessoal.

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