Você, certamente, já sentiu aquele frio no estômago, passou horas rolando na cama sem conseguir dormir ou percebeu a boca seca mesmo após beber muita água — geralmente antes de um acontecimento importante, como uma viagem ou a mudança para outro país.
O que pouca gente antecipa é que esses sintomas também podem surgir após a chegada ao novo destino. Muitas vezes, o planejamento prévio e a euforia pelo novo cenário impedem o expatriado de perceber que um turbilhão de emoções ainda está por vir.
O que é a ansiedade pós-mudança e por que ela acontece?
A ansiedade pós-mudança é uma reação natural do corpo e da mente diante de grandes transições, especialmente quando envolve mudança de país.
Essa condição de saúde é carinhosamente apelidada de Síndrome de Ulisses, em referência ao herói mitólogico grego que sentiu solidão por passar vinte anos longe de sua terra. Segundo a psicóloga Bruna Capozzi, a ansiedade pós-mudança não está catalogada no Classificação Internacional de Doenças, mas pode acarretar sintomas parecidos com os da depressão e de ansiedade; tais como dificuladade para dormir, dor de cabeça, tristeza e tédio.
A primeira referência ao nome Síndrome de Ulisses foi dada pelo psiquiatra espanhol Joseba Achotegui, secretário da Associação Mundial de Psiquiatria. Ele começou a notar algumas mudanças em 2002, ano em qual houveram mudanças em leis migratórias na Europa. Achotegui associa muitas das características da ansiedade pós-mudança às do luto, como a perda da família e dos entes queridos, da terra local e do idioma.
Como professor na Universidade de Barcelona (UB), Achotegui foi supervisor da primeira dissertação de doutorado a abordar o tema, em 2014. A sudanesa Mozdalifa Elkheir concluiu que um quarto dos imigrantes árabes na Catalunha sofrem da Síndrome de Ulisses, em grande parte devido à islamofobia, dificuldades econômicas e de comunicação.
A ansiedade pós-mudança pode se manifestar dias ou até meses depois da chegada, e acontece devido a alguns estressores:
- O choque cultural, pois desafia crenças, hábitos e referências do dia a dia.
- A sobrecarga sensorial causada por um novo idioma, sons, cheiros e rotinas exige mais energia mental.
- A sensação de isolamento que surge quando a rede de apoio anterior está distante e a nova ainda não foi construída.
- Dificuldade financeira causada por atrasos nas transferências de recursos pagos pela empresa contratante, utilização de reservas financeiras destinadas a outras finalidades, dificuldade em alugar ou vender imóveis no pais de origem, desafio por encontrar um trabalho mais longo do que o previsto, custo de vida mais alto do que o imaginado, etc.
- Burocracia ou atraso nas questões legais para adquirir visto, contrato de aluguel, residência, cidadania; o que pode exigir elevada capacidade de raciocínio em outro idioma para solucionar em tempo hábil.
- A mudança na identidade que ocorre quando o expatriado percebe que precisa se reinventar para se adaptar.
Para executivos acostumados a lidar com situações de alto estresse organizacional, o impacto pode ser ainda maior. Isso porque o ambiente corporativo lhes ensinou a lidar com pressão, mas não necessariamente com emoções ligadas à adaptação cultural, identidade e pertencimento.
Um exemplo real
Há alguns anos, acompanhei um executivo que havia se mudado com a família para assumir um cargo de liderança na Ásia. Ele havia feito um planejamento impecável: escola para os filhos, apartamento próximo ao trabalho, agenda de reuniões organizada antes mesmo de desembarcar.
Porém, dois meses após a chegada, começou a sentir insônia constante, irritabilidade e um sentimento de desconexão — algo que nunca havia experimentado em sua carreira. Ao longo do processo de Coaching Transcultural, ele percebeu que estava tentando replicar exatamente o mesmo ritmo e estilo de vida do país de origem, sem dar espaço para absorver a nova cultura nem para criar rotinas de equilíbrio. As escolas eram severas demais para o perfil dos seus filhos; teria sido melhor morar em um bairro residencial com parques e jardins para a família, pois perto do trabalho havia muito barulho da rua. Enfim, tudo poderia ter sido construído de um modo adequado ao novo país e não às experiências anteriores.
Com ajustes e novas estratégias, conseguiu não apenas recuperar o bem-estar, mas também se conectar profundamente com o novo ambiente.
Estratégias para lidar com a ansiedade pós-mudança
Mesmo que o programa de Coaching Transcultural seja mais eficaz quando realizado antes da mudança, ainda há muito o que fazer se você já chegou ao novo país. Aqui estão algumas ações práticas:
- Construa sua rede de apoio – Participe de eventos locais, grupos de expatriados e atividades que facilitem novas conexões.
- Crie pequenas rotinas – Estabeleça horários fixos para refeições, sono e lazer para recuperar a sensação de estabilidade.
- Mantenha vínculos com o país de origem – Mas sem se isolar; use a conexão com a sua cultura como fonte de segurança, não de fuga.
- Pratique a imersão gradual – Experimente novos hábitos, comidas e locais aos poucos, para que a adaptação seja orgânica.
- Cuide do corpo para acalmar a mente – Atividades físicas, respiração consciente e descanso adequado ajudam a regular a ansiedade.
Encontrando o ponto de equilíbrio
A mudança internacional é uma oportunidade única de crescimento, mas também um convite para olhar para dentro e desenvolver novas formas de lidar com o desconhecido. Encontrar o ponto de equilíbrio não significa se adaptar rápido a qualquer custo, mas sim permitir que o processo aconteça com respeito ao seu tempo e às suas emoções.
Se você está prestes a se mudar ou já vive no exterior e sente que o processo está mais desafiador do que imaginava, entre em contato. Juntos, podemos criar um plano personalizado para reduzir a ansiedade, acelerar sua integração e transformar a mudança em uma experiência enriquecedora para a sua vida e carreira. O meu Programa de Coaching Transcultural nasceu dos meus estudos quando vivencei pela primeira vez o choque cultural, morando em Jacarta, na Indonésia. Depois disso, tive várias experiências e vivências internacionais e hoje moro na Itália. Além dos estudos em Neurociência, Antropologia, Cooperação Internacional, e Gestão (minha área de formação), eu passei na pele muitas experiências e apoio líderes globais de organizações internacionais em todo o mundo. Tenho certeza que você pode se redescobrir mais forte após as nossas conversas.

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